Em jeito de romaria, atrás de um grupo grande de pessoas, percorríamos os caminhos laterais do pavilhão, que nos levariam à entrada do maior evento mundial de Música Trance em Utrecht. O grande protagonista da noite era o maior DJ do Mundo que, talvez não tão por acaso, é Holandês: a super estrela Armin Van Buuren.
Existem disputas sobre quem é mesmo o maior DJ do Mundo. Talvez seja o Tiesto, que talvez não tão por acaso também é Holandês. Mas neste caso vamo-nos contentar com o facto do Armin Van Buuren poder ser o segundo maior do mundo, porque as lições que se podem aprender com ele já são bastante boas, e eu não estou a planear ir a outro concerto de trance tão cedo.
Voltando ao caminho até a entrada do State of Trance Utrecht. Enquanto contornávamos o pavilhão do Jaarbeurs por fora, já sentiamos a vibração da música no corpo que vinha de dentro. Imensa e electrificante. Estou muito fora do mundo trance, e honestamente não é a minha onda, mas perante o convite pensei “Porque não? Deve ser bom para dançar um bocado”.
Ao entrarmos, foi imediata a realização que estava dentro de um sub-movimento cultural o qual nunca tinha observado de perto antes da minha vida. Chamo-lhe sub-movimento, porque existem muitos tipos de música electrónica, com diferenças que não me atrevo perceber quanto mais explicar. Ora, este sub-movimento trance vale a pena ser admirado só pelas diferentes personagens que o habitam. No evento de Utrecht grande parte das pessoas eram Holandesas, uma vez que a música electrónica é muito apreciada aqui, mas também estavam milhares de pessoas vindas todo o mundo para ali dançar.
Dos pastilhados aos que simplesmente gostam deste genéro, dos jovens aos velhos (e bem velhos e velhas!), aos estranhos de cabeça rapada que se passeavam em tronco nu, das miúdas pseudo-góticas, às miúdas que se tirassem tudo o que há falso nelas perderiam 15 kilos, aos totalmente queimados, aos aparentemente “normais”, sim, vi mais gente diferente por metro quadrado do que em qualquer parte nenhuma do mundo.
Mas isso não é mau, é só diferente da minha perspectiva pessoal, e faz parte de uma realidade, dum sub-movimento cultural e entrando onde quero entrar, faz parte de um mercado muito específico. Mercado esse, que Armin Van Buuren foi exímio em explorar. Cheguei a essa conclusão numa das pistas de danças: todo este movimento foi alimentado por Armin van Buuren com uma genialidade comercial como poucas empresas o sabem fazer.
O Armin Van Buuren tem 37 anos, nasceu em Leiden numa família que gostava muito de música e que desde sempre lhe alimentou essa paixão. Comprou um computador aos 10 anos e começou a experimentar com a música electrónica.
O grande salto na carreira de Armin aconteceu quando em 2001 começou a fazer o seu programa de rádio de divulgação da música trance. Armin pegou num produto que já existia, desenvolveu-o à medida de um mercado muito específico e criou um meio de divulgação adequado, não apenas para passar sua música, mas que servisse para alimentar o movimento e divulgar outros DJ’s. Rede e contactos de artistas: CHECK!
O programa de rádio “State of Trance” está no ar há quase 13 anos e todas as semanas é ouvido por uma comunidade de 20 milhões de ouvintes. Todas as semanas Armin faz duas horas programa em Holandês e Inglês. E o Marketing à volta do programa não foi deixado ao acaso. Rede e comunidade de ouvintes: CHECK!
O “produto” Armin van Buuren cresceu com a sua comunidade. Por um lado a comunidade de DJ’s que foram divulgados no programa, foram convidados a integrar a sua empresa discográfica em 2003. Em gestão chama-se a isto integração vertical e horizontal, e traz a grande vantagem de se deixar de estar dependente de empresas exteriores a “montante” do processo criativo e de se ganhar dinheiro com os outros DJ’s, que em vez de serem concorrência são parceiros.
Por outro lado, com a comunidade de ouvintes a crescer, e para alimentar o seu crescimento, diversifica-se portfolio de produtos: as festas vieram primeiro. Todos os meses o State of Trance é feito numa parte do mundo diferente: em Janeiro foi Moscovo, Fevereiro foi por acaso Utrecht.
A comunidade de ouvintes ganhou um nome e um estatuto especial: os “cadetes” de Armin seguem-no na rádio e nas festas.
E as festas servem o mesmo propósito do programa de rádio: divulgam o Trance enquanto género musical, o Armin e os seus DJ’s. E de forma muito inteligente alimentam com conteúdo o programa de rádio, porque são transmitas em directo.
E depois existem um conjunto de sub-produtos e sub-serviços que são explorados nestas festas: merchadising, marcas parceiras, patrocínios, etc. Armin transformou-se numa marca e também numa máquina de fazer dinheiro. A música electrónica representa na Holanda um mercado muito significativo, com impacto interessante também a nível de exportações.
Uma estratégia integrada em que muita gente ganha e muita gente perde, se as coisas não correrem bem.
E enquanto dançava, pensei nisto tudo e fiz a nota mental: nunca desvalorizar o poder das comunidades. Há muito a aprender com o Armin numa pista de dança.